segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Calvinismo, Abraham Kuyper (1)

Eu e André estamos apaixonados pela leitura (a dois) de Calvinismo, de Abraham Kuyper. Para o autor, uma das três condições para a caracterização de um verdadeiro "sistema de vida" (ou o que eu talvez chamaria de "cosmovisão singular e frutificadora") é a precisa especificidade sobre a relação com Deus. (Os outros dois são: relação com o homem e relação com o mundo.)  Assim, muito didaticamente, temos:

1. Paganismo: Deus está na criatura.
2. Islamismo: Deus está separado da criatura.
3. Catolicismo: relação entre Deus e a criatura é mediada pela igreja.
4. Modernidade: negação de Deus.
5. Calvinismo: relação direta entre Deus e a criatura.

É interessante notar a contrapartida: nas demais cosmovisões apontadas por Kuyper há ou fusão (no paganismo), ou dualismo (separação, obstáculo ou apagamento de uma das pontas). A ideia de relacionamento só é plena no calvinismo. Ocorre-me, assim, que o Calvinismo é a única cosmovisão que traduz de modo acertado a ideia bíblica do casamento como uma figura central para o encontro entre Cristo e a igreja (ou seja, Deus e a criatura). O amor íntimo e sem reservas que pressupõe o relacionamento do casal precisa desse caráter não fusional, mas direto e dinâmico.

E, agorinha mesmo, vi essa leitura surpreendentemente complementada por Allister McGrath em A vida de João Calvino, quando observa na p. 175 que "repetidamente Calvino apela para a fórmula baseada na cristologia, distinctio sed non separatio", para tratar da união não fusional entre a divindade e a humanidade em Jesus Cristo. Novamente, é no calvinismo que temos a noção mais acurada dessa dualidade: assim como Cristo é Deus e homem ao mesmo tempo, o conhecimento de Deus e o conhecimento de nós mesmos não é a mesma coisa, mas são duas coisas distintas que, no entanto, não podem ser separadas. Esse padrão (junto mas não indistinto) é uma constante no calvinismo e, para mim, é um dos aspectos mais importantes do âmago identitário dessa cosmovisão. Algo que faz toda a diferença quanto a ser saudável não só em teologia, mas em tudo o mais.

2 comentários:

  1. Realmente a relação é direta: predestinados para a salvação, céu; predestinados para a ira, inferno. E ponto final. Só mesmo a mente "doentia" de Paulo para endossar essa doutrina essênia no corpo do cristianismo. Logo Jesus que de coração aberto proclamou: "quem quiser venha, beba e sacie-se"; se eu não posso ir por não ser predestinado, o problema é meu, não de Paulo. Mas tudo bem, vamos dar um desconto para Paulo; afinal de contas, ele não conheceu o "Jesus real" só aquele Jesus quase gnóstico que ele viu nos seus delírios.

    abraços (desculpe se peguei pesado, colega rs)

    ResponderExcluir
  2. Errado, Eduardo!

    Em primeiro lugar, note que os apóstolos que conheceram o Senhor antes de sua ressurreição não deram o menor sinal de notar alguma distorção por parte de Paulo, seja ela essênia, gnóstica ou qualquer outra. Muito pelo contrário, aliás: os Atos dão um claro testemunho do acordo fundamental entre todos eles. E Pedro dá testemunho da autenticidade da doutrina de Paulo com todas as letras, inclusive com uma advertência que deveria ser mais bem aproveitada hoje em dia:

    "[...] tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles." (2 Pedro 3.15-16)

    E, em segundo lugar, porque o próprio Cristo, que você cita tão seletivamente, também disse: "ninguém poderá vir a mim, se, pelo Pai, não lhe for concedido" (João 6.65).

    Abraços!

    ResponderExcluir