domingo, 25 de julho de 2010

O grande jogo VII

Com relação à invasão americana do Iraque, Magnoli é tão antiamericano quanto quase todo mundo neste país. Seus principais argumentos são dois. Primeiro, ele condena a "unilateralidade" da administração Bush, que não deu bola às recriminações da ONU. Como se essa instituição, com suas ditaduras na Comissão de Direitos Humanos e outros absurdos, devesse ser levada a sério como árbitro entre Bush e Saddam. E como se a ONU já fosse o governo mundial que sempre sonhou em ser. O problema, na verdade, é que, a fim de que a ONU pudesse levar a efeito sua função pacificadora no mundo, os Estados-membros transferiram a ela parte de suas próprias prerrogativas quanto à defesa de seus interesses nacionais contra os abusos de seus inimigos. Mas, se a ONU não tem o poder (nem o desejo, aliás) necessário para cumprir sua parte, que direito tem ela de reclamar se um de seus membros decide resolver o problema por si mesmo?

O segundo argumento de Magnoli é que a administração Bush teria inventado uma justificação para seu ato com base no conceito de "guerra preventiva", pelo qual qualquer governo pode ser destituído com base na mera possibilidade de vir a causar problemas algum dia. Trata-se, é claro, de uma caricatura barata da verdadeira justificativa oferecida para a guerra: num mundo pós-11 de setembro, manter no Oriente Médio um ditador genocida que não cumpre os acordos de inspeção contra armas de destruição em massa era, de fato, uma ameaça à segurança nacional americana. Saddam Hussein não era de modo algum um sujeito inofensivo contra quem foram levantadas suspeitas injustificadas. (Michael Moore também espalhou mentiras dessa ordem em seu Fahrenheit: segundo ele, o Iraque "nunca tinha assassinado um único cidadão americano".) Além de ter expulsado os inspetores da ONU sob os olhos impassíveis de Bill Clinton, Saddam também deu abrigo a terroristas procurados por fazer atentados contra americanos, financiou entidades terroristas que mataram americanos em Israel e empreendeu uma fracassada tentativa de assassinato contra o presidente americano em 1992. Finalmente, Magnoli não menciona as inúmeras conexões entre o governo iraquiano e a Al Qaeda.

Magnoli quer nos fazer crer que não havia justificativas reais para a destituição de Saddam Hussein, e que o governo Bush armou um complô apenas para garantir os interesses geopolíticos e econômicos americanos no Oriente Médio. Não nego, é claro, que houvesse interesses dessa ordem; aliás, os conservadores americanos que apoiaram a guerra também não o negaram jamais. Por si mesmo, esse fato demonstra que a acusação de hipocrisia lançada por Magnoli e por meio mundo não se sustenta de modo algum.

2 comentários:

  1. Caro André, me esclareça aqui: basta criticar um presidente dos EUA para se tornar, automaticamente, anti-americano?

    Os estrangeiros que criticam Lula são anti-Brasil?

    "que não deu bola às recriminações da ONU"...

    A ONU estava certa: onde estão as armas de destruição em massa?

    ResponderExcluir
  2. Caro T., esclareço com prazer: eu não disse que Magnoli se torna antiamericano pelo simples fato de criticar Bush. Disse que a natureza de sua crítica à administração Bush é um exemplo adicional de seu antiamericanismo. Críticas a Bush todo mundo tem, inclusive eu. Mas a maneira como Magnoli insere as dele no conjunto de suas análises de política internacional fazem dele inconfundivelmente um antiamericano, embora menos que a maioria dos analistas brasileiros. E ter um antiamericanismo abaixo da média é motivo suficiente para que ele não se considere antiamericano. De qualquer forma, ele vai muito além de apenas "criticar um presidente dos EUA".

    A ONU tinha razão, mas não em negar a ameaça que Saddam representava, e sim em proteger o amplo esquema de corrupção que alguns de seus membros mantinham juntamente com Saddam através do programa "Oil for Food". A objeção da ONU à invasão do Iraque não se baseou na asseveração da ausência de armas de destruição em massa - coisa que ela não tinha como garantir, já que seus inspetores haviam sido expulsos do país durante a administração Clinton, como mencionei no post. Dada essa ocorrência, ninguém - nem mesmo os opositores da invasão - esperavam que as armas não seriam encontradas. A gritaria contra a invasão não se baseou nesse argumento, e sim nos que mencionei no post. E todos os lados envolvidos se surpreenderam quando as armas não foram encontradas. Os indícios da existência delas eram bons, Saddam tinha um histórico de inimizade contra os EUA e não estava colaborando com as inspeções. Isso basta.

    Além do mais, embora não tenham sido encontradas armas de destruição em massa, foram encontradas outras coisas, como as provas da ajuda dada por Saddam à Al Qaeda, que também mencionei no post.

    Abraços!

    ResponderExcluir